Um laudo da Polícia Federal feito com base na quebra do sigilo fiscal
da empreiteira Andrade Gutierrez destaca o pagamento de R$ 3,6 milhões
para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva entre 2011 e 2014. São
valores que "transitaram" por uma conta chamada "overhead" trilhando
mesmo percurso do dinheiro que abasteceu empresas investigadas por
lavagem de dinheiro de propina alvo da Operação Lava Jato, como firmas
ligadas aos operadores financeiros Adir Assad, Fernando "Baiano" Soares,
Mário Goes e Julio Gerin Camargo.
"Foram
identificados lançamentos contábeis indicativos de pagamentos e doações a
empresas e instituições vinculadas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, no montante de R$ 3.607.347, entre os anos de 2011 e 2014",
registra o laudo 10/2016, da PF.
"Cumpre destacar
que, conforme subseção III.3.5, recursos destinados à LILS transitaram
pela conta contábil 'overhead' e realizaram percurso similar ao de
empresas que estão sendo investigadas no âmbito da Operação Lava Jato
pela prática de lavagem de capitais e/ou pelo recebimento dissimulado de
recursos."
Delação premiada. O laudo é de 25 de
fevereiro e foi elaborado pelos peritos criminais federais Daniel Paiva
Scarparo, Audrey Jones de Souza e Ivan Roberto Ferreira Pinto. Anexado
nesta segunda-feira, 18, ao inquérito aberto para apurar envolvido da
Andrade Gutierrez no esquema de cartel e corrupção na Petrobrás, o
documento servirá para a Lava Jato cruzar dados documentais com as
declarações dadas pelos executivos da empreiteira, no acordo de delação
premiada.
Os repasses a Lula foram incluídos no
item "Pagamentos a ex-agentes públicos". Em depoimento prestado nesta
semana, na Justiça Federal, no Rio, o ex-presidente da Andrade Gutierrez
Otávio Marques Azevedo citou o nome do ex-presidente num pedido de
apoio em contrato firmado na Venezuela. O executivo negou ter feito
pagamento de propinas ao petista. Segundo ele, um percentual de 1% de
contratos foi cobrado por outros interlocutores do PT, entre eles o
ex-tesoureiro João Vaccari Neto. Por meio de sua defesa, Vaccari nega.
O
que chama atenção dos investigadores da Lava Jato é que os pagamentos
feitos para Lula integram a conta contábil "Overhead", alvo de um
capítulo específico do laudo. "A análise do SPED (Sistema Público de
Escrituração Digital) da Construtora Andrade Gutierrez revelou a
existência de uma conta contábil intitulada 'Overhead'", informam os
peritos.
"O 'overhead' contempla gastos comuns não alocados
diretamente a um produto, ou seja, possui natureza preponderantemente
indireta", informa o laudo. "Por possuir natureza de gasto comum e
preponderantemente indireto, o 'overhead' é controlado pela unidade
central da entidade contábil analisada, ou seja, contempla gastos comuns
feitos pela administração central (sede ou matriz, home office
overhead) e não vinculados diretamente a um produto específico (contrato
de obra), porém atribuíveis indiretamente por meio de rateio em um
conjunto de produtos (contrato de obra)."
Os
peritos explicam que esse tipo de conta contábil é utilizado na formação
de orçamentos de obras "onde se calcula a taxa de administração central
a ser embutida nos orçamentos das construtoras".
"A
partir dos gastos da sede para manter as atividades de direção geral da
empresa (área técnica, administrativa, financeira, contábil etc),
busca-se inserir nos orçamentos das obras (geradores de receitas) as
parcelas relativas a estes gastos de administração central sob a forma
de rateio proporcional ao porte de cada obra/contrato, seja proporcional
ao faturamento, seja proporcional ao custo estimado de cada item".
Mesmo controle.
A partir da explicação, os peritos da PF informam que constataram nas
análises que "a Andrade Gutierrez registrou e controlou na conta
"Overhead", parte dos pagamentos realizados às empresas investigadas por
terem realizado operações de lavagem de dinheiro e/ou transferência
dissimulada de capitais, bem como doações eleitorais."
São
cinco pagamentos para a LILS e quatro doações para o Instituto Lula
entre 2011 e 2014. "Da mesma forma, oportuno esclarecer que os
pagamentos realizados à empresa LILS Palestras, Eventos e Publicações
Ltda, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, também transitaram
pela conta contábil 'Overhead', indicando que a Andrade Gutierrez tratou
tais despesas como gastos indiretos a serem apropriados aos custos das
obras."
Os peritos da PF relacionam nesse trecho os
pagamentos a Lula aos custos de contratos da Petrobrás. "Todos estes
gastos compuseram parcela dos custos de administração central nos
contratos de obras realizadas pela empresa revelando, em parte, a forma
como tais pagamentos encareceram os custos de construção e, por
consequência, os custos de aquisição por parte dos contratantes de obras
como as da Petrobrás."
O documento aponta ainda
que o controle sobre tais despesas seriam feitos pela "alta
administração". "Sistemática revela ainda que os pagamentos realizados
às empresas investigadas foram autorizados pela alta administração da
entidade, uma vez que vinculados ao centro de controle de custo
'overhead', e não a um contrato/obra específico, onde tais pagamentos
seriam autorizados e realizados pelos gestores de cada contrato/obra."
Ao
todo, a PF analisou contratos em que a Andrade Gutierrez participou na
Petrobrás que totalizaram R$ 7,2 bilhões - R$ 1,54 bilhão em
contratações diretas e R$ 5,6 bilhões por meio de consórcios. São
contratos de obras em refinarias como a Replan, em Paulínia (SP), e no
Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).
Os
inquéritos que apuram suposto envolvimento de Lula no esquema de
corrupção na Petrobrás foram enviados ao Supremo Tribunal Federal (STF)
para decisão de a quem compete as investigações, a primeira instância,
em Curitiba, ou à Procuradoria Geral da República, em Brasília.
COM A PALAVRA, O INSTITUTO LULA
Por meio da assessoria de imprensa do Instituto Lula, o ex-presidente informou:
"Os
serviços foram palestras. Lula realizou 72 palestras para 45 empresas
de diversos países e setores, inclusive para a Infoglobo, das
Organizações Globo. Todas as palestras foram realizadas regularmente,
com valores cobrados em condições iguais de todas as empresas, com nota
fiscal e todos os impostos foram pagos dentro da lei. Elas não tem
nenhuma relação com nenhuma ilegalidade ou vantagem indevida. Foram
5 palestra para a Andrade Gutierrez, conforme nosso relatório que
relata TODAS as palestras do ex-presidente e está disponível na
internet:
http://institutolula.org/uploads/relatoriopalestraslils20160323.pdf
Sobre
o laudo, por informações veiculadas na imprensa, os executivos da
Andrade Gutierrez já afirmaram em delação premiada não existir nenhuma
irregularidade na contratação de palestras.
As doações ao
Instituto são para a manutenção de suas atividades e o ex-presidente não
recebe do Instituto Lula. Todas as doações também foram feitas com o
devido registro e impostos pagos. A Receita Federal recebeu do Instituto
Lula todas as informações sobre o uso desses recursos nas atividades do
Instituto.
Por decisão do Supremo Tribunal Federal, as
investigações conexas ao ex-presidente encontram-se sob sigilo de
justiça e análise do ministro Teori Zavascki. A divulgação desse
relatório parece ter fins midiáticos e de provocação a essa determinação
do Supremo Tribunal Federal."
COM A PALAVRA, A ANDRADE GUTIERREZ
A
empreiteira Andrade Gutierrez, procurada pela reportagem via assessoria
de imprensa, informou que não iria comentar o documento.
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