segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

MICHELLE OBAMA: LEGITIMA (E ADORÁVEL) ATÉ FIM COM POPULARIDADE MAIOR QUE A DO MARIDO


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Os olhos do presidente americano Barack Obama só começaram a marejar-se em seu discurso de despedida do cargo, na terça-feira 10, quando ele citou a mulher, Michelle. “Você assumiu um papel que não pediu e o desempenhou com graça, coragem, estilo e bom humor”, disse ele em Chicago. Foi uma descrição emotiva, mas também precisa, da primeira-dama, que deixará a função no próximo dia 20 com uma popularidade maior que a do marido: 72% contra 64%.

Não há na Constituição americana nenhuma menção ao cargo de primeira-dama. Cabe a cada uma delas decidir o que pretende fazer e como. Quando estreou, há oito anos, Michelle chocou pela espontaneidade. Em entrevistas, disse que Obama roncava, cheirava mal pela manhã e não colocava a manteiga de volta na geladeira. Em meados de 2012, Jodi Kantor, repórter do jornal The New York Times, lançou a biografia Os Obamas, na qual dizia que Michelle entrava em conflito frequente com os assessores do marido, desaprovava as opiniões deles e era frustrada e insegura. Para Jodi, ela se enquadrava no estereótipo da “mulher negra americana”, brava e durona. Michelle só falou abertamente sobre isso no ano passado, no programa de Oprah Winfrey: “Esse é o tipo de coisa em que você se pergunta… Essa gente nem me conhece. De onde veio isso?”.

Com o tempo, as críticas — com óbvio componente racista — foram desaparecendo. Michelle aprendeu a canalizar sua personalidade expansiva, tão convidativa para os programas de televisão, para causas nobres. Com ela, tudo soava leve e divertido, e também tinha um objetivo claro. Quando surgiu em um vídeo mostrando como deixava seus braços bem torneados, Michelle queria estimular os americanos a manter uma vida saudável. Ao cantar canções de Beyoncé e Stevie Wonder em um carro durante o programa The Late Late Show with James Corden, aproveitou para falar em prol das meninas ao redor do mundo que não têm acesso à educação.

Não importava quão longínquas ou sonhadoras fossem suas bandeiras. Michelle não perdeu a autenticidade porque se manteve próxima dos americanos. Não era uma mulher da alta sociedade. Não trazia no sobrenome um dos clãs políticos americanos, como Bush, Kennedy ou Clinton. Michelle LaVaughn Robinson, seu nome de solteira, cresceu no sul de Chicago, onde morou com os pais e o irmão num apartamento de um quarto. “O pai de Michelle teve esclerose múltipla e morreu relativamente jovem. O trabalho duro que a mãe teve para que ela e o irmão fossem para a escola ficou impresso em sua índole”, diz a historiadora Katherine Sibley, especialista em primeiras-damas da Universidade Saint Joseph, em Filadélfia.

Talvez por isso, em nenhum momento Michelle pecou pelo esnobismo na Casa Branca. Quando a empresária Sara Blakely foi visitá-la na residência oficial, confidenciou que havia esperado tanto tempo na fila para uma foto que seus pés estavam doendo. Então, perguntou se podia tirar os sapatos. Michelle prontamente respondeu que sim, e que Sara podia dizer a qualquer assessor que a mandasse pôr os calçados de volta que ela a tinha autorizado. “Michelle, com sua juventude, trouxe frescor à Casa Branca. Ela podia ser a tia bacana que qualquer um adoraria ter”, diz a historiadora Stacy Cordery, que trabalha na Biblioteca Nacional das Primeiras-Damas em Canton, no Estado de Ohio.

Dos traços de caráter, há os que podem ser fabricados e os que não podem, sob o risco de soarem falsos ou ridículos. Michelle foi legítima até o fim do mandato. Muito dessa sua naturalidade veio da transposição dos sentimentos de mãe e de esposa para a Casa Branca. Em um discurso de 2012, ela brincou que atuava como mãe em chefe (mom-in-chief), um trocadilho que cunhou com o termo comandante ­em chefe, usado para designar o presidente americano. Nas fotos com as filhas, Malia e Sasha, seu olhar ao mesmo tempo controlador e carinhoso transparece a todo momento. Também abundaram as demonstrações de carinho entre o casal presidencial, junto há 25 anos. “Eles misturaram disciplina e leveza. Exerceram suas funções com seriedade e também se divertiram muito”, diz o jornalista Peter Slevin, autor do livro Michelle Obama: uma Vida, lançado em 2015. Foram incontáveis os abraços sutis, as mãos dadas e as risadas de cumplicidade, que podiam ocorrer tanto em uma convenção democrata como no intervalo de uma partida de basquete. No aniversário de Obama no ano passado, Michelle expressou seu amor nas redes sociais: “Cinquenta e cinco anos, e esse sorriso ainda me afeta todos os dias. Parabéns, Barack. Te amo”. O mundo sentirá falta de Michelle.

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